Monossílabo sagrado Om

“O Rei do Mundo” conhece os pensamentos de todos os que dirigem o destino da humanidade… conhece-lhes as intenções e as ideias. Este poder foi dado a Agharti pela ciência misteriosa de Om, palavra que inicia todas as nossas orações.
Om é o nome de um antigo santo, o primeiro dos Goros ou Gurus, que viveu há cerca de trezentos mil anos. Esta época é muito anterior à era do presente Manu. Por outro lado o primeiro Manu do nosso Kalpa (sendo Vaivaswata o sétimo) é chamado Swâyambhuva, “o que subsiste por si mesmo” ou Logos eterno. Ora, Logos pode ser designado como o primeiro dos Gurus ou “Mestres Espirituais”, sendo efectivamente Om um nome de Logos.
Este nome encontra-se também no antigo simbolismo cristão, sendo mais tarde considerado como uma abreviatura de Avé Maria, mas que foi primitivamente equivalente à reunião do letras extremas do alfabete grego, alpha e ôméga, para significar que o Verbo é o princípio e o fim de todas as coisas; na realidade ele é ainda mais completo, pois significa o princípio, o meio e o fim.
O monossílabo Om dá a chave da repetição hierárquica das funções entre Brahâtmâ e os seus dois assessores. Segundo a tradição hindu, os três elementos deste monossílabo sagrado simbolizam respectivamente os “três mundos”, os três termos de Tribhuvana: a Terra (Bhû), a Atmosfera (Bhuvas) e o Céu (Swar.), ou por outras palavras, o mundo da manifestação corporal, o mundo da manifestação subtil ou psíquica e o mundo primordial não manifesto. Estes são por ordem inversa, os domínios próprios de Mahanga, Mahâtma e Brahâtmâ.

Excerto resumido do capítulo V de “O Rei do Mundo”, 1958, René Guénon, Edições 70, Lisboa

“O Rei do Mundo” de René Guénon

Saint-Yves d’Alveydre numa obra póstuma publicada em 1910, referiu um misterioso centro iniciático, designado pelo nome de Agarttha. Em 1924, Ferdinand Ossendowski publicou um livro sobre as suas viagens através da Ásia Central, com relatos quase idênticos a Saint-Yves. Entre outras, realço as afirmações seguintes: a existência de um mundo subterrâneo com ramificações sob os continentes e os oceanos, pelos quais se estabelecem comunicações invisíveis entre todas as regiões da terra; a existência de momentos, durante a celebração subterrânea dos Mistérios Cósmicos, em que os viajantes que se encontram no deserto se detêm e até os próprios animais permanecem silenciosos; a história de uma ilha, já desaparecida, habitada por homens e animais extraordinários.
O título de “Rei do Mundo” aplica-se a Manu, o Legislador primordial e universal, cujo nome pode encontrar-se, sob diversas formas em povos antigos: Mina ou Ménès para os Egípcios, Menw para os Celtas e Minos para os Gregos. Manu não designa uma personagem histórica ou lendária, mas sim, um princípio, a Inteligência Cósmica que reflecte a Luz Espiritual pura e formula a Lei (Dharma) que regula as condições do nosso mundo e do nosso ciclo de existência. Ele é, ao mesmo tempo, o arquétipo do homem enquanto ser pensante (mânava).
Este princípio pode ser manifestado por um centro espiritual estabelecido no mundo terrestre, em que o chefe dessa organização representaria o próprio Manu, pelo grau de conhecimento atingido para poder exercer essa função. Ele seria a expressão humana do princípio face ao qual se anularia enquanto indivíduo. Tal será o caso de Agarttha, se este centro recebeu e preservou a herança da antiga “dinastia solar”.
Contudo Saint-Yves, não vê o chefe supremo de Agarttha como o “Rei do mundo”, mas antes como “Soberano Pontífice”. Ossendowski complementa que se trata de duplo poder, que é ao mesmo tempo, sacerdotal e real. O carácter “pontificial” é apanágio do chefe da hierarquia iniciática, que simbolicamente designa o que estabelece a comunicação entre este mundo e os mundos superiores.
Agarttha é o ponto fixo que todas as tradições concordam em designar simbolicamente como o “Pólo”, por ser sobre ele que se efectua a rotação do mundo, representado geralmente pela roda, quer para o Celtas, para os Caldeus e mesmo para os Hindus.
Este é o verdadeiro significado da suástica, símbolo divulgado por toda a parte, que na sua essência, representa “o signo do pólo”. Apesar da suástica poder ser um símbolo de movimento, não se trata de um movimento qualquer, mas de um movimento de rotação em torno de um centro imutável, e é ao ponto fixo, que se refere directamente este símbolo.
Na teoria da Cabala hebraica, os “intermediários celestes”, que se relacionam com este tema, são Shekinah e Metatron.
As passagens da escritura que se lhe referem são as que mencionam a instituição de um centro espiritual: a construção do Tabernáculo, a edificação dos Templos de Salomão e Zarobabel. Este centro constituído em condições regularmente definidas, era um lugar de manifestação divina, sempre representada como “Luz”.
Shekinah apresenta-se sob múltiplos aspectos, entre os quais, um interno e outro externo. Representado Gloria e Paz, no seu aspecto interno no que respeita ao princípio e no aspecto externo no que respeita ao mundo manifesto. Lembremos relativamente ao primeiro aspecto das teorias dos teólogos acerca da “luz da glória” na qual se opera a visão beatífica, e em relação ao segundo, do sentido esotérico da “paz”, referida por todas as tradições como sendo um dos atributos fundamentais dos centros espirituais estabelecido neste mundo.
Por outro lado, Vulliand fala de um “mistério relativo ao Jubileu”, que corresponde num dado sentido à ideia de “Paz”, de onde conclui que “ a ideia central do Jubileu é o regresso de todas as coisas ao seu estado primitivo”. O que está implicitamente presente em todas estas considerações, é o Pardes, o centro deste mundo, que o simbolismo tradicional compara ao coração, centro do ser e residência divina (Brahma-pura, na doutrina hindu), sendo o Tabernáculo uma imagem deste centro.
Noutra perspectiva, Shekinah é a síntese dos sefirotes, na árvore sefirótica, a “coluna da direita” está ao lado da Misericórdia e a “coluna de esquerda” ao lado do Rigor; numa dada perspectiva pode-se identificar a Misericórdia coma Paz e o Rigor com a Justiça.
“A Cabala dá a Shekinah um irmão gémeo”, chamado Metatron. Este “vocábulo comporta todas as acepções de guardião, Senhor, enviado, mediador”; ele é “o Anjo da Face” e também “o Príncipe do Mundo”. Metatron, além do aspecto da Clemência, comporta também o da Justiça; não é apenas o “Grande Sacerdote”, mas também o “Grande Príncipe” e “chefe das milícias celestes”, ou seja, não contém só o princípio do poder real, mas também o do poder sacerdotal ou pontifical.
De resto, Melek, “rei” e Maleak, “anjo” ou “enviado”, não são mais do que duas formas de uma só e mesma palavra. Embora Mikäel se identifique com Metatron, apenas representa um aspecto dele, à face iluminada corresponde uma face obscura, representada por Samaël.
Segundo Saint-Yves, o chefe supremo de Agarttha tem o título de Brahâtmâ ou Brahmâtmâ, “suporte das almas no Espírito de Deus”, sendo os seus dois assessores Mahâtmâ, “representante da Alma Universal” e Mahânga, “símbolo de toda a organização material do Cosmos”. Estas três identidades correspondem à divisão hierárquica que as doutrinas ocidentais representam pelo ternário “espírito, alma e corpo”. Estes termos sânscritos referem-se sempre a princípios e nunca a seres humanos ou indivíduos.
Para Ossendowski, o Mahâtmâ “conhece os acontecimentos do futuro”, o Mahânga “ dirige as causas desses acontecimentos” e Brahâtmâ “pode falar com Deus face a face”, pois ele ocupa o ponto central onde se estabelece a comunicação directa do mundo terrestre com os estados superiores e através destes com o Princípio Supremo.
“Quando sai do templo, O Rei do Mundo irradia a Luz Divina”, diz Ossendowski.

Resumo dos capítulos I a IV de “O Rei do Mundo”, 1958, René Guénon, Edições 70, Lisboa